Reforma Tributária – Lei Complementar 214/2025 – Instituição do IBS/CBS/IS – Caracteristicas Gerais

Publicada em 16 de janeiro de 2025, a Lei Complementar (LC) nº 214/2025, resultado da aprovação do Projeto de Lei Complementar (PLP) nº 68/2024, regulamenta a Reforma Tributária sobre o consumo, conforme estabelecido pela Emenda Constitucional (EC) nº 132/2023.

O Presidente da República vetou alguns dispositivos, alegando inconstitucionalidade ou contrariedade ao interesse público. Os vetos foram recebidos no congresso em 17 de janeiro e serão analisados pelo Congresso Nacional no prazo de 30 dias, sendo necessária maioria absoluta para rejeitá-los.  Assim, caso nada for deliberado pelo Congresso até o dia 05 de março de 2025 a pauta será trancada, obrigando sua votação.

Principais temas dos vetos:

  • IBS/CBS:
    • Fundos de Investimento e fundos patrimoniais: Vetados dispositivos que excluíam fundos de investimento e patrimoniais da condição de contribuintes.
    • Recolhimento pelo adquirente – Responsabilidade solidária: Vetado dispositivo que tornava o adquirente de bens/serviços responsável solidário pelo recolhimento de IBS/CBS.
    • Importação de serviços financeiros: Vetado dispositivo que previa alíquota zero para importação de serviços financeiros.
    • Utilização de espaços físicos a título oneroso: Vetado dispositivo que previa a tributação de IBS/CBS para permissão de uso de espaço físico a título oneroso.
    • Formas de intimação do contribuinte: Vetadas previsões de intimação por via postal e edital.
    • Revisão das listas de bens e serviços sujeitos a regime diferenciado: Vetado dispositivo que impunha condições adicionais para a revisão das listas.
    • Exclusão de serviços anteriormente relacionados à soberania e à segurança nacional da lista de regimes diferenciados: Vetados dispositivos que favoreciam determinados serviços de segurança com redução de 60% nas alíquotas de IBS/CBS.

  • Imposto Seletivo (IS):
    • Exportações: Vetado dispositivo que previa que o IS não incidiria nas exportações.

  • Demais disposições:
    • Zona Franca de Manaus (ZFM) e Áreas de Livre Comércio (ALC): Vetados dispositivos que previam a apropriação de créditos de IBS na importação de bem material para revenda presencial na ZFM e ALC, e do crédito presumido de CBS para produtos industrializados na ZFM ou sujeitos à alíquota zero de IPI.

Principais aspectos da EC nº 132/2023 e LC nº 214/2025:

  • Criação de novos tributos:
    • Contribuição sobre Bens e Serviços – Federal: CBS
    • Imposto sobre Bens e Serviços – Subnacional: IBS
    • Imposto Seletivo: IS
    • Nova contribuição dos Estados: Sobre produtos primários e semielaborados, para investimento em obras de infraestrutura e habitação.
    • IPI a zero: Será mantido para os produtos que tenham industrialização incentivada na ZFM.

Tributos extintos:

  • COFINS
  • ISS
  • PIS
  • ICMS

Período de transição previsto na EC: Coexistência dos dois sistemas tributários – tributos antigos e novos recolhidos em paralelo.

2026: Início da Fase de Testes

  • CBS: Será cobrada com uma alíquota reduzida de 0,9%. O valor recolhido poderá ser compensado com as contribuições devidas ao PIS/Pasep e à Cofins no mesmo período.
  • IBS: Iniciará com uma alíquota experimental de 0,1%, sendo 0,05% destinada ao estado e 0,05% ao município. O montante recolhido poderá ser compensado com os valores devidos de ICMS e ISS.

2027: Implementação Parcial

  • CBS: Entrará em vigor plenamente, substituindo o PIS/Pasep e a Cofins, que serão extintos. A alíquota será definida pelo Senado Federal.
  • IBS: Continuará com a alíquota de 0,1%, mantida até 2028.
  • IS: Será instituído para incidir sobre produtos e serviços prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente. As alíquotas e a base de cálculo serão estabelecidas por lei ordinária.
  • IPI: Terá suas alíquotas reduzidas a zero, exceto para produtos industrializados na Zona Franca de Manaus ou similares produzidos em outras regiões do país.

2028: Continuidade da Transição

  • CBS: Mantém-se com a alíquota definida em 2027.
  • IBS: Permanece com a alíquota de 0,1%.
  • ICMS e ISS: Continuam com suas alíquotas integrais.

2029 a 2032: Transição Gradual

  • IBS: As alíquotas serão aumentadas gradualmente, enquanto as alíquotas do ICMS e do ISS serão reduzidas em 10% ao ano em relação às alíquotas vigentes em 2028. Por exemplo, em 2029, o IBS terá uma alíquota correspondente a 10% da alíquota total prevista, aumentando progressivamente até 40% em 2032.
  • ICMS e ISS: Serão reduzidos proporcionalmente ao aumento do IBS, até sua completa extinção em 2033.

2033: Implementação Completa

  • IBS: Será plenamente implementado, substituindo integralmente o ICMS e o ISS, que serão extintos.

Durante todo o período de transição, as alíquotas de referência da CBS e do IBS serão fixadas pelo Senado Federal e revisadas anualmente, com o objetivo de manter a carga tributária total equivalente à do período anterior à reforma. Além disso, o Imposto Seletivo (IS) continuará incidindo sobre produtos e serviços específicos, conforme definido em lei.

Sistemática geral de incidência do IBS e da CBS na LC nº 214/2025:

  • Incidência ampla:  São tributadas operações onerosas envolvendo bens materiais e imateriais, incluindo direitos e serviços, resultantes de qualquer ato ou negócio jurídico. Além disso, a legislação também prevê a incidência sobre operações não onerosas envolvendo bens e serviços, desde que estejam expressamente reguladas, como: Brindes e bonificações, desde que não estejam condicionadas a eventos futuros; Transferência de bens ou valores para sócios ou acionistas não contribuintes, seja por devolução de capital, distribuição de dividendos em bens ou quaisquer ativos que tenham gerado direito à apropriação de crédito; Fornecimentos de bens ou serviços sem cobrança ou com valor inferior ao de mercado para partes relacionadas.

  • Não incidência: Prestação de serviços por pessoa física (PF) quando vinculada a uma relação de emprego ou atuação como administrador; Transferência de bens entre estabelecimentos pertencentes ao mesmo contribuinte; Alienação e transferência de participação societária; Transferência de bens decorrente de processos de fusão, cisão, incorporação, integralização ou devolução de capital; Rendimentos financeiros e operações com títulos ou valores mobiliários, exceto quando enquadrados no regime específico de serviços financeiros; Distribuição de dividendos e pagamento de Juros sobre o Capital Próprio (JCP), incluindo juros e remuneração ao capital pagos por cooperativas; Doações sem exigência de contraprestação.

  • Base de cálculo: Valor da operação ou valor de mercado dos bens ou serviços. Exceções:
    • Impostos sobre a operação (IBS, CBS, IPI)
    • Descontos incondicionais
    • Reembolsos ou ressarcimentos por operações de terceiros
    • Durante a transição, ICMS, ISS, PIS/Cofins e PIS/Cofins-Importação
    • Contribuição de iluminação pública (CIP)
    • Valor de mercado será usado quando:
      • Não há valor na operação
      • O valor é indeterminado
      • O valor não é em dinheiro
      • Há transações entre partes relacionadas

  • Sujeito passivo: O fornecedor, o importador ou aquele previsto expressamente na LC.

  • Momento de ocorrência do fato gerador: Regra geral, no momento do fornecimento, mas há previsão de antecipações.

  • Local da operação: Regras específicas para bens móveis, imóveis e serviços.

  • Cashback: Sistema de devolução de parte do imposto para famílias de baixa renda.

  • Alíquotas: Alíquota padrão e regimes diferenciados.

  • Não cumulatividade: Não cumulatividade condicionada ao pagamento dos tributos em etapa anterior.

  • Isenção e imunidade: Anulação do crédito relativo às operações anteriores.

  • Alíquota zero: Manutenção do crédito relativo a operações anteriores.

  • Suspensão: Crédito pelo adquirente será admitido no momento da extinção dos débitos suspensos.

  • Ressarcimento de saldos a recuperar de IBS/CBS: Prazos e condições para o ressarcimento.

  • Apuração e pagamento: Período de apuração mensal e centralizado. A apuração será mensal e centralizada, consolidando operações de todos os estabelecimentos do contribuinte. O pagamento pode ser realizado via:
    • Compensação com créditos de IBS/CBS.
    • Split payment – retenção do tributo no pagamento ao fornecedor.
    • Recolhimento pelo adquirente (em certas hipóteses).
    • Recolhimento pelo responsável tributário.

  • Split payment: Segregação e recolhimento de IBS/CBS no momento da liquidação financeira da transação de pagamento. O split payment será utilizado para segregar e recolher IBS e CBS no momento do pagamento ao fornecedor. A adoção desse sistema dependerá da implementação de um sistema digital unificado para meios de pagamento.

Incentivos fiscais e regimes fiscais favorecidos na LC nº 214/2025:

  • Suspensão de incidência, redução de alíquota a zero e concessão de créditos presumidos de IBS/CBS.
  • Redução a zero das alíquotas do IPI relativas a produtos industrializados na ZFM.
  • Crédito presumido da CBS para indústrias das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste.
  • Regimes aduaneiros especiais, Zonas de Processamento de Exportação (ZPE) e regimes de bens de capital – suspensão do pagamento de IBS/CBS.
  • Regimes fiscais específicos: Combustíveis (monofásico), Serviços financeiros, Operações com bens imóveis e Planos de saúde.

Imposto Seletivo (IS) na LC nº 214/2025:

  • Sistemática de incidência: Mensal e centralizada.

  • Imunidades: Exportações e operações com energia elétrica e telecomunicações.

  • Não incidência: Bens e serviços com redução de 60% da alíquota padrão de IBS/CBS.

  • Base de cálculo: Valor de venda, valor de arremate, valor de referência. É o valor total da operação, incluindo todos os valores cobrados pelo fornecedor. No entanto, alguns itens são excluídos da base de cálculo, como os próprios impostos (IBS, CBS ICMS, ISS, IPI e o próprio IS), descontos incondicionais.

  • Alíquotas: Específicas ou ad valorem.

  • Sujeito passivo: Fabricante, importador, arrematante, produtor-extrativista, fornecedor do serviço.

  • Apuração: Mensal e centralizada.

Saldos credores acumulados de PIS/Cofins e ICMS na LC nº 214/2025:

  • ICMS: Aproveitamento dos saldos credores existentes ao final de 2032. A EC prevê o aproveitamento dos saldos credores existentes ao final de 2032, que tenham sido homologados pelos respectivos entes federativos, nos termos de LC, mediante a compensação com o IBS:
    • pelo prazo remanescente do regime atual para os créditos relativos à entrada de mercadorias destinadas ao ativo permanente;
    • em 240 parcelas mensais, iguais e sucessivas, nos demais casos; e
    • atualizados pelo IPCA a partir de 2033.
    • A LC, contudo, não trata do tema, que atualmente é objeto do PLP nº 108/2024, ainda pendente de apreciação pelo Senado Federal.

  • PIS/Cofins: Créditos não apropriados ou não utilizados até a data de extinção das contribuições poderão ser utilizados para compensação com a CBS ou ressarcidos em dinheiro.
    • permanecerão válidos e utilizáveis, mantida a fluência do prazo para sua utilização;
    • deverão estar devidamente registrados no ambiente de escrituração do PIS e da Cofins;
    • poderão ser utilizados para compensação com o valor devido da CBS; e
    • poderão ser ressarcidos em dinheiro ou compensados com outros tributos federais, observados os demais requisitos dispostos na LC.

  • Litigiosidade inicial: Apesar de ainda estar no início, a Reforma Tributária já levanta questões complexas e suscita debates acalorados no âmbito jurídico. Um exemplo disso é a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7779, que busca suspender os efeitos dos artigos 149 e 150 da Lei Complementar (LC) 214/2025. Essa ação contesta as restrições impostas à isenção de impostos para a compra de veículos por pessoas com deficiência, um direito garantido por lei.

  • A ADI 7779 é um exemplo do dissenso que a Reforma Tributária provoca, com potenciais impactos para diversos setores da sociedade. A decisão final sobre a ADI 7779, bem como outros desafios jurídicos que certamente surgirão, moldará o futuro da Reforma Tributária e seu impacto na economia e na sociedade brasileira.

  • Concretização da reforma tributária: A Lei 214/2025 põe fim há  quase 40 anos em que se discute a simplificação  e desoneração de nosso sistema constitucional tributário que acabou afunilando-se nas PEC 102/19 e 45/19 , sendo que destas , a reforma acabou se embasando na PEC 45/2019, ficando muito longe de simplificar o nosso sistema tributário e desonrá-lo. Embora seja precipitado analisar seus efeitos no comércio e na indústria, não há como olvidar que a prestação de serviço está fadada  a uma tributação excessiva, que pode até inviabilizar alguns setores.

  • O “Curinga” que o Congresso entregou ao Poder Executivo, que usamos aqui em simbolismo a carta do baralho que em certos jogos muda de valor conforme a combinação, ficou com a exclusão do IPI na unificação no IBS. Considerando-se as regras de transição, a necessidade de congelar ou reduzir alíquotas tanto do IBS e CBS, segundo média  ponderada da carga tributária máxima experimentada antes da reforma, os limites e necessidades de alíquotas, considerando-se ainda a tendência de uma máquina administrativa que quando mais arrecada mais gasta desordenadamente, não há duvidas que havendo necessidade e, considerando-se que o IPI continua a viger nas regras originais da CF/88, suas alíquotas que passaram a ser zerdas pela LC 214/2025, poderão independentemente da regra da legalidade, anterioridade e noventena serem  aumentadas. Não fosse isso suficiente, já detecta-se inconstitucionalidade que nasceram desde a EC 132, ou vieram a existir no texto final da LC 214/2025. Um exemplo disso é a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7779, que busca suspender os efeitos dos artigos 149 e 150 da Lei Complementar (LC) 214/2025. Essa ação contesta as restrições impostas à isenção de impostos para a compra de veículos por pessoas com deficiência, um direito garantido por lei.

  • Some-se a isto, a intenção já demonstrada pelos Estados que devem perder arrecadação no período de transição ICMS com o IBS, em incluir o IBS na Base de cálculo do ICMS em clara ofensa à vedação da bi-tributação dos impostos (art. 145 CF/88).

  • Imperativo as empresas, desde já criarem seus comitês com profissionais fiscais e jurídicos internos e contratados para analisar o impacto da reforma tributária, desde as modificações que à partir de 2026 ocorrerá em suas escriturações fiscais, com a vigência, bem como se preparar para as necessárias discussões que se façam necessárias no Judiciário para valer valer seus direitos constitucionais cujo constituinte se preocupou em fazê-lo e que de forma mais rigorosa se deu na constituinte de 1988, lembrando-se que uma EC em si, não garante sua validação no sistema constituciona..

Departamento de Direito Tributário
Maia Sociedade de Advogados.

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