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Domínio Público: Um Novo Capítulo na História de Mickey Mouse. Será?

Uma das notícias mais marcantes na história da propriedade intelectual, que tem reverberado intensamente nos meios de comunicação, refere-se à expiração do prazo de proteção autoral do personagem de animação mais conhecido do mundo, “MICKEY MOUSE”, criado em 1928 por Walt Disney e Ub Iwerks, e que agora, com a virada do ano de 2024, está oficialmente em domínio público nos Estados Unidos desde 1º de janeiro.

Todavia, antes de sairmos utilizando livremente a imagem desse icônico ratinho, se faz necessário tecer alguns comentários e esclarecer melhor essa história de “domínio público”.

Primeiramente, é pertinente mencionar que toda obra de produção intelectual, tais como obras literárias, artísticas, audiovisuais, fotográficas, de desenho, entre outras, são protegidas por lei específica, garantindo aos seus autores, criadores, titulares e inventores o direito de exploração com exclusividade, bem como, uma remuneração, caso terceiros explorem economicamente a obra protegida.

No entanto, em determinado momento, o prazo de proteção de uma obra intelectual se encerra, e a faz “cair em domínio público”, tornando-a disponível para uso sem a necessidade de autorização do autor ou de qualquer pagamento, permitindo que qualquer pessoa a utilize de maneira livre.

O tempo de proteção varia de acordo com as leis de cada país. Assim, uma obra que está em domínio público em determinado país, não necessariamente estará em outro.

Nos Estados Unidos, o prazo de proteção varia conforme circunstâncias específicas que devem ser consideradas individualmente. Nessa situação em particular, o Congresso do país de origem do personagem alterou a lei em 1998, acrescentando a ela 20 anos ao prazo então existente, passando a garantir uma proteção de até 95 anos a partir da primeira publicação, para obras audiovisuais, tal como a obra em questão se enquadra.

No Brasil, as regras também devem ser observadas em suas particularidades. A Lei de Direitos Autorais (Lei nº 9.610/98) estabelece como regra geral que o prazo de proteção é o tempo de vida do autor mais 70 anos, com início em 1° de janeiro do ano posterior ao do falecimento do autor ou do último co-autor.

Em casos de obras anônimas, a proteção abrange um período de 70 anos, contados a partir de 1° de janeiro do ano seguinte ao da primeira publicação.

Quanto às obras fotográficas e às audiovisuais, como no caso da obra que estamos falando, o prazo é de 70 anos, contados de 1° de janeiro do ano subsequente ao de sua divulgação, conforme preleciona o Art. 44 da Lei de Direitos Autorais.

Pois bem, à luz dos esclarecimentos apresentados, a conclusão torna-se evidente: Não é qualquer obra ou imagem relacionada ao Mickey (ou à Minnie) que pode ser livremente utilizada por terceiros, uma vez que há uma questão temporal crucial a ser observada. No caso, apenas o curta-metragem de animação intitulado “Mickey Mouse Steamboat Willie”, lançado nos cinemas em 1928, que encontra-se em domínio público.

Portanto, somente a versão dos personagens presentes nessa animação específica pode ser reproduzida por qualquer pessoa, seja com ou sem fins lucrativos. As adaptações posteriores do famoso camundongo permanecem com a proteção autoral vigente, sem a possibilidade de uso sem autorização.

Vale destacar que, em uma declaração à AFP (Agence France-Presse), a própria Disney afirmou que “continuará protegendo seus direitos sobre as versões mais modernas do Mickey Mouse e de outras obras que ainda estão sujeitas a direitos autorais”.

Além disso, é interessante mencionar que o referido curta-metragem de animação que estreou no cinema em 1928 e entrou em domínio público nos EUA somente neste ano, já estava sob domínio público no território brasileiro desde 1º de janeiro de 1999, por se tratar de uma obra audiovisual, cujo prazo de proteção é de 70 anos, contados do ano posterior ao de sua divulgação, conforme vimos acima.

Por fim, importante dizer que a Disney ainda detém a proteção sobre a marca “MICKEY MOUSE” em diversos países, inclusive com imagens do ratinho associadas. E no âmbito da legislação que regula a proteção de marcas registradas no Brasil (Lei nº 9.279/96), a dinâmica é distinta, pois o prazo de vigência é de 10 anos, contados da concessão do registro, podendo ser prorrogado por períodos iguais e sucessivos, sem limite definido para o término. Convém ressaltar, porém, que essa proteção restringe-se à categoria de produtos e/ou serviços para a qual a marca foi efetivamente registrada naquele território.

Dessa forma, é fundamental ter cautela antes de reproduzir qualquer personagem relacionado ao Mickey Mouse, verificando se a reprodução refere-se efetivamente à obra primária lançada em 1928, se referida obra encontra-se em domínio público no país onde se pretende utilizá-la e se a categoria de produtos ou serviços para os quais o uso será feito não está protegida por marca registrada.

Por isso, antes de sair por aí reproduzindo a imagem do ratinho mais popular do mundo, busque orientação jurídica adequada para garantir conformidade com as leis de direitos autorais e propriedade industrial.

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